Já faz algum tempo que o fenômeno dos e-books, livros inteiros distribuídos eletronicamente para serem lidos em uma tela, vêm se alastrando e aumentado seu espaço nas vendas, desempenhando assim um papel fundamental tanto para espalhar a obra de autores já conhecidos como para alavancar a carreira de principiantes. Reconheço que os e-books possuem inúmeras vantagens (a imensa facilidade na distribuição, quando comparados aos livros físicos; a redução no uso de papel, poupando um pouco mais o meio ambiente no futuro; a facilidade na correção de erros, com novas edições podendo ser preparadas em um tempo muito mais curto; entre outras), mas a verdade é que sempre repudiei a ideia de ter um livro que não pudesse segurar em minhas mãos. Para mim, o livro não está contido apenas em suas palavras, mas também em sua capa, formato, textura, cor e até mesmo cheiro, coisas que os e-books não podem proporcionar.
Porém, uma ideia me ocorreu de como tornar os e-books tão ou talvez até mais interessantes que os livros físicos: transformá-los em plataformas multimídia. Muitas vezes nos livros existem referências ao mundo real em formato de músicas, filmes, pinturas e etc que são usadas para a construção de um determinado momento, um sentimento ou até mesmo parte vital da trama. Enquanto as referências podem até ser muito bem descritas no livro, jamais essas descrições serão tão boas quanto se a obra referenciada estivesse ali, acessível para todos. Então que tal usar os e-books para fazer justamente isso? Bem, escrevendo esse post eu descobri, graças a Fernanda, que sim, isso já é feito para alguns livros, o que me deixou mais interessado em possuir meu próprio leitor de e-books. Vou dar alguns exemplos de como algumas obras que li poderiam ser enriquecidas com o devido uso das funcionalidades de um e-book:
Para quem leu o excelente Jogador N°1, de Ernest Cline, notou várias menções a ícones da cultura pop dos anos 80, como jogos, filmes e músicas. Logo de cara no livro (portanto, não é um spoiler, podem ler sossegados) um homem entra em cena dançando a música do Oingo Boingo: Dead Man's Party.
É uma cena divertida que praticamente nos entrega todo o objetivo do livro. Mas como não conhecia a música quando li, essa parte ficou incompleta em minha cabeça. Pior, ficou errada, pois com esse nome eu imaginei que fosse uma música de metal pesado, totalmente diferente do que ela de fato é. Teria sido ótimo se na hora eu pudesse ter clicado no livro e a música começasse a tocar, assim me dando o verdadeiro tom da cena. Um e-book poderia proporcionar essa sensação colocando um link para a música nesse momento específico.
Já em O Código Da Vinci, de Dan Brown, há várias citações a lugares e objetos reais. Enquanto a Mona Lisa é facilmente reconhecível para grande parte dos leitores, certos quadros e esculturas eu nunca havia nem sequer ouvido falar, menos ainda podia imaginar como eram. O livro faz um trabalho decente em descrevê-los, mas é como eu disse, nada se compara ao original. Se houvesse ali um link entre a referência e uma imagem da obra ou do lugar onde se passa a cena ajudaria os leitores menos versados, e também não atrapalharia o fluxo de leitura de quem já conhece, pois bastaria ignorar esse link (o que já é mais difícil de ser feito na versão ilustrada do livro, onde as imagens estão espalhadas pelas páginas, ocupando espaço do texto). Não há necessidade de colocar as imagens no meio do livro. Basta deixá-las em um arquivo separado para então só aparecerem quando, e se, solicitadas.
Por fim, em O Cardume, de Frank Schätzing, existe uma riqueza de detalhes tão grande que chega a assustar. Não é um livro muito fácil de ser lido pois muitas vezes você se pergunta se o que está lendo é verídico ou se o autor é simplesmente um ótimo cientista falso. Mas sendo verdade ou não, o livro pode levantar sua curiosidade sobre muita coisa, desde biologia marinha até organismos unicelulares. Com certeza muita pesquisa foi feita para a sua escrita. Se pudéssemos ter acesso a essa mesma pesquisa enquanto lemos isso poderia enriquecer o livro para nós. Não por confirmar (ou desmentir) o que o autor colocou nas páginas do romance, mas sim por nos mostrar a fonte de sua inspiração. Algo que eu acho, bem, inspirador.
Porém, mesmo já estando em prática a ideia de e-books multimídia, vejo dois problemas com ela. Um deles é exclusivo das editoras/autores, que é a obtenção dos direitos autorais para a adição de outros tipos de obras, de maneira integral, dentro do livro (o próprio Jogador N° 1 tem tantas referências que não sei se seria viável obter todas elas). O outro é um pouco mais sútil e também dos leitores: a diminuição da imaginação como parte da leitura. Usar esses recursos que mencionei acima podem até engrandecer os livros, mas também podem acabar com parte de sua magia. Já estamos em um momento no qual a imaginação é cada vez menos estimulada em prol do conforto, do luxo e da facilidade, e livros sempre foram uma ótima fonte de estímulo a imaginação. Rechear um livro com links para músicas, imagens, vídeos e tudo mais que o autor tenha imaginado pode até ser bom para a melhor propagação de sua mensagem; mas não é nada bom para o leitor ter tudo pronto e entregue de bandeja para ele. A liberdade de podermos criar o mundo do livro em nossa mente é a melhor parte da leitura. É isso que faz com que a Terra Média seja majestosa e perigosa; que o Grande Irmão seja uma figura quase divina; que o Hotel Overlook seja absolutamente opressor e assim por diante, em milhares de outros exemplos dentro de milhares de outros mundos dentro unicamente da nossa imaginação, criados com o auxílio de seu autor.
Então, da maneira como vejo os e-books poderiam muito bem serem a evolução da leitura para melhor apresentarem o conteúdo de suas obras, mas isso deve ser feito com extremo cuidado para que o efeito, que pretende ser enriquecedor, não acabe por empobrecer.
E vocês, o que acham?
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